Escola Waldorf a Oliveira

Em busca do rei secreto

22 Outubro 2012

A grande amiga da nossa escola, Luisa Barreto, enviou-nos este poema especialmente para esta época.

EM BUSCA DO REI SECRETO

(conto para o advento a partir dos 8 anos)

Em tempos nada distantes        
Um país ambicioso
Desejou ser poderoso
E conquistou os restantes

Tornou-se rico e tão forte!
Diziam os habitantes:
Talvez sim, nós temos sorte…
E achavam-se importantes

Mas um dia aconteceu:
Uma doença alastrou
Toda a gente adoeceu
Tão grave ela se tornou

Não se podiam mexer
Depois deixavam de falar
(De que vale enriquecer?)
Já nem sabiam pensar.

Que se podia fazer
Para a doença acabar?

O Rei então reuniu
Conselheiros e doutores
E depois se decidiu
Entre estes sábios senhores

Mandar o Rei um pregão
P’lo país a anunciar
«Quem souber a solução
P’ró mal que ataca a nação
Que a venha ao rei contar»

Chegou um velho pastor
Que disse ao Rei inquieto:
- “Manda a Princesa, senhor
Procurar o Rei Secreto”

O Rei primeiro nem queria
Deixar a princesa ir
Mas já ele adoecia
Teve de se decidir

Lá foi ela mundo fora
O coração a cantar
A princesa o povo adora
Seu povo quer ajudar

“Rei Secreto, onde se esconde?
Onde o posso descobrir?
Tenho de ir, não sei bem onde
Mas não hei-de desistir”

No primeiro dia andou
Até a noite cair
Mas o Rei não encontrou
Nem sabia aonde ir

“Rei Secreto, aonde moras?
Naquilo que não se vê?
Diz-me, ó Rei, porque demoras
Se o meu coração crê?

Qual é a tua morada?
Onde moras afinal?
Será que a noite calada/estrelada
Me dará um sinal?”

Subiu a uma colina
Dali via o céu inteiro
Quem tem alma peregrina
Tem o céu por companheiro!

Como o céu era sem fim?
Era de um azul profundo
“Debruças-te sobre mim…
E assim abraças o mundo”

Sentia que se alargava
Abraçava o céu imenso!
Não tinha medo de nada
“Sou maior do que o que penso”

Assim, se encheu de coragem
Envolvida pelo céu
E embalada pela aragem
A princesa adormeceu

De manhã, e já desperta
Repara com grande espanto
Que estava de azul coberta
Com um lindo e grande manto

…Rei Secreto
Te dei um sinal
Manto assim, decerto
Que não há igual

Continua a caminhada
Continua a andar p’ra frente
Mesmo se estava cansada
Ajudava toda a gente

Gente vinha ter com ela
Alguns vinham com rancor
Quase davam cabo dela
Ela sempre dava amor

Pedia-lhe uma mulher
Esfarrapada e já doente:
- “Oiça lá, você não quer
Dar-me alguma roupa quente?”

E logo ali se despiu
Princesa filha de rei
Deu-lhe a roupa e lhe sorriu
- “Toma, não apanhe frio
Com a capa ficarei”

Mas então, ó maravilha!
Recebi um novo p’lo dado
Debaixo da capa brilha
Lindo vestido encarnado


… Vestido assim..

Continuara o seu caminho
O terceiro dia a andar
Avança devagarinho
As forças estão a faltar

O caminho é já mais estreito
Há mais poeira na estrada
Ela avança já sem grito
Sente uma pressão no peito
Mas está determinada

Nunca esquece o seu intento:
“Meu andar é já tão lento

“Rei Secreto, sei-o bem
Não te acho se não tento
Andar sempre mais além”

Vai subindo p’la ladeira
No topo vê um pomar
De frondosas macieiras
De maçãs a cintilar

Deixa-se cair no chão
E põe-se então a pensar:
“As minhas forças não são
Fortes como o coração
Que me diz para avançar”

Assim que pensou aquilo
Sente uma aragem passar
E num balançar tranquilo
De folhagem pelo ar
Duma árvore viu cair
Da maior delas tombar

Dois sapatinhos dourados
Mesmo prontos p’ra calçar


Dois sapatinhos dourados
Mesmo prontos p’ra calçar
Quem havia de dizer!
Quem é que está a ajudar?
Quem tais sapatos meter
Com mais força há-de avançar!

Os calçou a princesinha
Em menos de dois instantes
Nova força ao corpo vinha!
Que força que agora tinha!
Nunca tal sentira dantes

E continua a jornada
Em busca do Rei Secreto
Diz para si, esperançada:
“Ele está aqui por perto!”

E como era a pique a estrada
Ao quarto dia desceu
Por uma senda inclinada
Tão íngreme e afundada
Que p’la terra se meteu

Não se via mesmo nada
Deixava de ver o céu
Só de terra rodeada
Desce por grutas escavadas
Numa escuridão de breu

Pouco a pouco clareou
Cada vez mais e mais luz
- “Aonde será que estou?
Onde é que isto me conduz?”

Cada vez ia mais fundo
Docemente uma luz erra
Vinda de um lugar profundo:
Era o coração da Terra!

Lá um grande espaço havia
E num trono se sentava
Um jovem Rei que sorria
Como o sol o Rei brilhava

“… Ó meu Rei Secreto
Por fim te encontrei
Tudo está quieto
Suspenso e tão perto
De nada mais sei…

Ó meu Rei escondido
Deixa-me aqui estar
O tempo é comprido
Posso descansar…

E pela gruta espalhados
Vieram ver a Princesa
Gnomos encarquilhados
Duendes esverdeados
E ondinas de tal beleza!

Também se entreviam fadas
Breves, lindas e douradas
As fadas estavam ali

“Ó meu Rei Escondido
Deixa-me aqui estar
O tempo é comprido
Posso descansar…”

Os guias da Humanidade
Lá esperavam tempo que há-de
Do futuro retornar

E a mais alta hierarquia
Dos Anjos, em harmonia
Eram música no ar

“Ó meu Rei Escondido
Por fim te encontrei
Tudo está quieto
Suspenso e tão perto
De nada mais sei…”

O Rei olhava a donzela
Com um longo, longo olhar
Percebera bem que ela
Merecera ali entrar

Pelo azul que a coloria
E o vermelho que usava
E os sapatos que trazia
Aonde o Sol rebrilhava!

Deu-lhe uma taça dourada
Cheia d’água transparente
- Prova esta água sagrada
E leva-a bem guardada
Para o teu povo doente

Fala ao teu povo de mim
Dá-lhe esta água a beber
E se curará, enfim
Aquele que quiser crer.

E a princesa provou
Da água que Rei lhe dera
Sorriu ao Rei, o saudou
Tomou a taça e voltou
P’ro mundo de onde viera

Muitos não quiseram crer
Que houvesse um Rei Secreto
“Como podia isso ser?!
Era uma ilusão, decerto…”

Mas depois houve, porém
A quem a água fez bem
E que fizeram curados
Foram os que acreditaram
Na água se saciaram
Sentiram-se abençoados

Muitos mais inda virão
Abrindo o seu coração
Áquilo que é bem verdade:
É que existe um Rei Secreto
Que nos dá a liberdade

É que existe um Rei Secreto
Que guarda a vida p’ra quem
O sente entre nós, bem perto
E por isso a ti vem

Sei que existe um Rei Secreto
Não é nenhuma quimera
Habita entre nós, bem perto
Habita entre vós, e espera.

(in The Christmas Story Book, Ed.Floris Book 1988. Tradução e adaptação em verso de um conto de E. Karr, por Luisa Barreto)